POR RODRIGO HENRIQUE
Caim e Abel brigam em um campo. Nas mãos, paus e pedras.
A narrativa bíblica de Caim e Abel, registrada em Gênesis cap. 4, apresenta o relato do primeiro homicídio praticado na história da humanidade, destacando os desdobramentos trágicos resultantes da inveja e do ódio.

O texto revela não apenas a ação nefasta de Caim, mas também a interação divina diante desse ato hediondo. Deus disse a Caim que a voz do sangue de Abel era notória, no entanto, há um contraponto crucial encontrado em Jesus Cristo, o qual é ressaltado em Hebreus 12.24, oferecendo-nos uma perspectiva de um sangue que clama por coisas melhores.

TEXTO BASE


Gênesis 4.8-10,16

⁸ E falou Caim com o seu irmão Abel: Vamos ao campo. E sucedeu que, estando eles no campo, se levantou Caim contra o seu irmão Abel e o matou. ⁹ E disse o Senhor a Caim: Onde está Abel, teu irmão? E ele disse: Não sei; sou eu guardador do meu irmão? ¹⁰ E disse Deus: Que fizeste? A voz do sangue do teu irmão clama a mim desde a terra [...] ¹⁶ E saiu Caim de diante da face do Senhor e habitou na terra de Node, da banda do oriente do Éden.

Hebreus 12.24

²⁴ E a Jesus, o Mediador de uma nova aliança, e ao sangue da aspersão, que fala melhor do que o de Abel.

CAIM MATA ABEL


Após ter sua oferta rejeitada por Deus (clique aqui para ler), Caim chamou seu irmão para irem juntos ao campo. "E sucedeu que, estando eles no campo, se levantou Caim contra o seu irmão Abel e o matou," tornando-se, assim, o primeiro homicida da história.

O coração de Caim já pertencia ao maligno e suas obras eram más e injustas diante de Deus (I Jo 3.12). Eis o perigo dos sentimentos perigosos que transpiram dentro da própria família: Movido pelo ciúme e pelo ódio, Caim matou Abel de forma deliberada e sem provocação.

DEUS AGE COM GRAÇA


Diante de tal circunstância, "disse o Senhor a Caim: Onde está Abel, teu irmão?" Ora, Deus estava, em verdade, oferecendo a Caim uma oportunidade para arrependimento e confissão. Observe o leitor(a) que Caim não buscou a Deus, mas Deus buscou a Caim. É o Senhor quem deu -- e sempre dá -- o primeiro passo em direção ao pecador.

Em face do questionamento divino, Caim poderia ter confessado seu pecado ao Senhor a fim de alcançar misericórdia, pois "quem esconde os seus pecados não prospera, mas quem os confessa e os abandona encontra misericórdia" - Provérbios 28.13

No entanto, Caim decidiu -- inutilmente -- encobrir sua conduta. Digo "inutilmente" porque o Senhor é o Deus que vê (El Roi) a tudo e a todos. Não há nada que esteja oculto diante daquele que tem os olhos como chamas de fogo. Ele conhece nossas obras, pensamentos e omissões!

CAIM REJEITA A OPORTUNIDADE


Não bastasse o encobrimento do homicídio, Caim cometeu outro pecado ao mentir para Deus, afirmando nada saber sobre o paradeiro do irmão. Sua atitude é irreverente e evidentemente não há qualquer temor em suas palavras. Provavelmente pensava que Deus fosse como um homem comum e ignorava, ao que tudo indica, sua onisciência.

Diferentemente de seu pai Adão, Caim escondeu seu pecado, mas logo descobriu que aquele que assim o faz não prospera diante de Deus. O Senhor, porém, demonstrou que é conhecedor de tudo e que a voz do sangue de Abel clamava a ele desde a terra. Não há máscaras que fiquem de pé em face do Rei da Glória!

A VOZ DO SANGUE QUE CLAMA 


Tal detalhe muitas vezes passa despercebido a muitos dos leitores e muitos dos que o percebem não o compreendem. Afinal, como é possível que o sangue clame a Deus? E o que fala sua voz? Pois bem, isso é o que iremos analisar.

Abel era um homem inocente. Nada havia feito que justificasse as obras más de Caim, mas este injustamente o matou, derramando sangue inocente sobre a terra. Sangue que, naquele mesmo instante, passou a clamar a Deus por justiça, isto é, por vingança.

Importa ressaltar que a palavra vingança tem um sentido um tanto desconfortável na mentalidade popular brasileira, mas seu significado em hebraico refere-se à justa retribuição pelo mal praticado, ou seja, a aplicação da justiça ou punição merecida.

A título de exemplo, vejamos o que disse o profeta Zacarias em suas últimas palavras antes de morrer: "O rei Joás não levou em conta que Joiada, pai de Zacarias, tinha sido bondoso com ele, e matou o seu filho. Este, ao morrer, exclamou: Veja isto o Senhor e faça justiça!" - II Crônicas 24.22

Zacarias era filho do sacerdote Joiada e pertencia a tribo de Levi. Era profeta de Deus e conhecia a Palavra do Senhor. Certamente, ao proferir suas últimas palavras, tinha em mente o que Deus havia dito por meio de seu servo Moisés: "Minha é a vingança e a recompensa [...]" - Deuteronômio 32.35

Outro texto interessante é o de Apocalipse que também nos é bastante esclarecedor acerca do tema: Aqueles mártires "clamavam com grande voz, dizendo: Até quando, ó verdadeiro e santo Dominador, não julgas e vingas o nosso sangue dos que habitam sobre a terra?"  - Apocalipse 6.10

Neste sentido, ao olharmos para Abel, entendemos que ele representa o primeiro de uma longa lista de fiéis que morrem e clamam por vingança diante de Deus. O sangue dos inocentes clama com grande voz em face da injustiça com que foram mortos. Porém, o sangue de Jesus fala melhor que o deles!

O SANGUE QUE CLAMA COISAS MELHORES


Lembremo-nos, por exemplo, de algumas das palavras de Jesus na cruz do Calvário. Ao olhar para seus assassinos, o Senhor não clamou por vingança, mas por perdão: "E dizia Jesus: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem" - Lucas 23.33,34

Diante disso, o sangue do Messias fala melhor, ou seja, clama por coisas melhores (Hb 12.24). Muitos dos chamados "pais da igreja", tais como Tertuliano, Orígenes, João Crisóstomo, Agostinho de Hipona e muitos outros entendiam que o sangue de Jesus falou melhor que o de Abel porquanto clamou por perdão e misericórdia, e não por vingança.

O sangue da aspersão, conforme Matthew Henry,

"diz coisas melhores do que o de Abel. Em primeiro lugar, ele fala (clama) a Deus a favor dos pecadores; pleiteia não por vingança, como fez o sangue de Abel contra aquele que o derramou, mas por misericórdia. Em segundo lugar; aos pecadores, em nome de Deus; declara o perdão dos seus pecados, e traz paz à alma deles; e recomenda a mais estrita obediência deles e o seu mais profundo amor e gratidão".¹

Apenas a título de exemplo, vejamos alguns dos muitos benefícios que este sangue nos traz: Redenção (Ef 1.7), purificação (Ap 1.5), justificação (Rm 5.9), reconciliação (Cl 1.20), aproximação de Deus (Ef 2.13), libertação (I Pe 1.18,19), santificação (Hb 13.12) e vitória (Ap 12.11).

Não obstante, porém, Jesus considerou que a voz do sangue dos justos não poderia simplesmente ser ignorada. Ao dirigir-se a um grupo de hipócritas fariseus, nosso Senhor viria a mencionar tanto Abel quanto Zacarias, dizendo o seguinte:

"Ai de vós que edificais os sepulcros dos profetas, e vossos pais os mataram! Bem testificais, pois, que consentis nas obras de vossos pais; porque eles os mataram, e vós edificais os seus sepulcros. Por isso, diz também a sabedoria de Deus: Profetas e apóstolos lhes mandarei; e eles matarão uns e perseguirão outros; para que desta geração seja requerido o sangue de todos os profetas que, desde a fundação do mundo, foi derramado; desde o sangue de Abel até ao sangue de Zacarias, que foi morto entre o altar e o templo; assim, vos digo, será  requerido desta geração" - Lucas 11.47-51

Ao comentar esta passagem, Hernandes Dias Lopes observa em Lucas 11.53,54 que "mesmo sendo Jesus o pregador, e mesmo pregando com tamanha contundência e poder, seus ouvintes não se quebrantaram; antes, endureceram-se e se enfureceram [...] Os escribas e fariseus saíram dali não para mudar de vida, mas para tramar contra a vida de Jesus".²

Estes pecadores poderiam, diante da pregação de Jesus, cair em arrependimento. Se o fizessem, a voz do sangue de Jesus falaria mais alto, concedendo-lhes coisas melhores (Jr 18.7,8) tal como recebeu Saulo (também chamado Paulo), que mesmo sendo um perseguidor da Igreja de Cristo, alcançou o perdão da parte do Senhor.

Oh quão sublime é a graça de Deus! Perdoa até mesmo os perseguidores e homicidas arrependidos. Aqueles hipócritas, porém, não abraçaram o arrependimento e escolheram seguir pelo caminho de Caim; e assim, a justa retribuição lhes fora dada (clique aqui para ler).

CONCLUSÃO


A história de Caim e Abel, embora marcada pela tragédia e pelo pecado, não é apenas um relato do passado, mas uma lição atemporal sobre as consequências da inveja, do ódio e da falta de arrependimento.

Por meio da análise desses textos, somos confrontados com a realidade do pecado e da justiça divina, mas também somos lembrados do incomparável poder do sangue de Jesus Cristo, que clama por perdão e misericórdia, oferecendo redenção e esperança para todos os que o recebem.

Que possamos, portanto, aprender com as lições da Palavra e buscar viver em conformidade com a vontade de Deus, encontrando no sacrifício de Cristo a verdadeira reconciliação e paz. A graça de Deus é maior que o pecado de homicídio, e o sangue da aspersão sempre falará mais alto na vida daqueles que crêem no sacrifício vicário de Cristo Jesus.

Christo Nihil Praeponere - “A nada dar mais valor que a Cristo”

FONTE


¹ HENRY, Matthew. Comentário Bíblico Novo Testamento - Atos a Apocalipse. Edição Completa, CPAD, vol. 6, 2020, p. 816. 

² LOPES, Hernandes Dias. Lucas - Jesus, o Homem Perfeito. São Paulo: Hagnos, 2017, p. 377.

BÍBLIA de Estudo Cronológica. CPAD, 2021.

BÍBLIA de Estudo Thomas Nelson. São Paulo: Thomas Nelson, 1º ed., 2021.

HENRY, Matthew. Comentário Bíblico Antigo Testamento - Gênesis a Deuteronômio. Edição Completa, CPAD, vol. 1, 2020.

HENRY, Matthew. Comentário Bíblico Novo Testamento - Atos a Apocalipse. Edição Completa, CPAD, vol. 6, 2020. 

LOPES, Hernandes Dias. Gênesis - O Livro das Origens. Hagnos, 2021.

LOPES, Hernandes Dias. Lucas - Jesus, o Homem Perfeito. São Paulo: Hagnos, 2017

POR 

O QUE A PÁSCOA TEM A VER COM O GÊNESIS?

É seguro dizer que os eventos registrados em Gênesis são a base sobre a qual todo o evangelho é construído.

Isso é exatamente o que vemos quando olhamos para a Páscoa. Tudo o que Jesus fez durante aquela semana foi feito para restaurar o relacionamento que Adão perdeu no início dos tempos. Aqui estão três maneiras importantes pelas quais Gênesis está vinculado à morte e ressurreição de Jesus:

 POR RODRIGO HENRIQUE

É comum que as pessoas tenham dúvidas acerca dos fatos narrados pela Bíblia. Porém, desde logo afirmamos que não há embasamento algum para crermos na existência de pessoas pré-adâmicas, muito pelo contrário. A Palavra de Deus nos afirma que Eva foi a mãe de todos os viventes, sem exceção: "E chamou Adão o nome de sua mulher Eva; porquanto era a mãe de todos os viventes" - Gênesis 3.20

POR RODRIGO HENRIQUE
Caim, com expressão de raiva, e Abel com as mãos erguidas aos céus.
"E Abel também trouxe dos primogênitos das suas ovelhas, e da sua gordura; e atentou o Senhor para Abel e para a sua oferta. Mas para Caim e para a sua oferta não atentou. E irou-se Caim fortemente, e descaiu-lhe o semblante" - Gênesis 4.4-5

  POR RODRIGO HENRIQUE

SERMÃO - DEUS E O PECADOR


"Deus e o Pecador" é um sermão que tem por finalidade apontar não apenas o pecado e suas consequências, mas busca apresentar, também, a maravilhosa graça e misericórdia de Deus. Neste propósito a mensagem se dividirá em cinco (5) tópicos didáticos, a saber: I - A Tentação; II - A Culpa; III - A Separação; IV - A Busca Pelo Pecador; e V - A Restauração.

POR RODRIGO HENRIQUE
Adão e Eva vestidos com peles de animais caminham juntos com semblante triste.
No relato do Livro de Gênesis encontramos a narrativa acerca da Queda da humanidade, ocasionada pela desobediência de Adão e Eva ao mandamento divino. Através da análise do texto bíblico podemos compreender melhor as consequências imediatas e mediatas deste ato pecaminoso.

Neste artigo iremos explorar as implicações da desobediência inicial desde a tentação por parte da serpente até a expulsão do Jardim do Éden, destacando a importância do perdão e da restauração divina na vida do pecador.

POR RODRIGO HENRIQUE
Casal se beijando em cerimônia de casamento
No mundo contemporâneo, permeado por mudanças sociais e culturais, o conceito de casamento muitas vezes é distorcido ou até mesmo desvalorizado. No entanto, ao olharmos para as Sagradas Escrituras, encontramos uma visão clara e profunda sobre essa instituição.

O casamento não é apenas uma convenção social, mas uma expressão da vontade divina, fundamentada nos princípios estabelecidos por Deus desde a criação.

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